A Força das mulheres que se recusam a ser subjugadas
A frase, dita sem alteração no tom de voz, soa como um comando frio, calculado. Mas não se enganem: mesmo sem o grito, há violência. Há o peso de séculos de misoginia e racismo que insistem em impor às mulheres ,e, em especial, às mulheres negras, um lugar subalterno, um espaço delimitado, onde possam ser controladas, silenciadas, "domesticadas".
Quando essa frase foi dirigida à ministra Marina Silva, em uma audiência no Senado, o gesto não era casual. Era simbólico, profundamente político. Não era só um homem interrompendo uma mulher. Era a tentativa de restabelecer uma ordem que não suporta ver uma mulher negra, amazônida, de origem simples, ocupar um dos postos mais importantes do governo brasileiro, e, mais do que isso, falar com autoridade, com firmeza, com dignidade.
A misoginia atinge todas as mulheres, é verdade, desde cedo, somos ensinadas que há limites para a nossa ambição, para a nossa fala, para os nossos sentimentos, para o nosso corpo. Mas quando essa mulher também é negra, a violência dobra, triplica, se entrelaça com o racismo estrutural, com as marcas da escravidão, com a herança colonial que persiste em dizer: “ aqui não é o seu lugar”.
Só que Marina Silva não se intimidou. Não baixou os olhos. Não cedeu à pressão. Ao contrário, rebateu com a altivez de quem conhece bem as estruturas que tentam, sistematicamente, apagá-la:
“O senhor gostaria é que eu fosse uma mulher submissa. Eu não sou.”
E depois, com a serenidade de quem sabe que o maior ato de resistência é permanecer de pé, completou:
“Não vou me intimidar, não.”
Esse é o momento que precisamos sublinhar, reverberar, celebrar. Porque, diante de uma tentativa de silenciamento, Marina Silva fez o que tantas mulheres negras, ao longo da história, têm feito: resistiu. E, ao resistir, inspirou.
Este episódio não é só sobre Marina. É sobre todas nós. É sobre a mulher que é interrompida em uma reunião de trabalho, sobre a jovem que é desencorajada a seguir na universidade, sobre a mãe solo que ouve diariamente que “não vai dar conta”, sobre todas aquelas que, quando ousam falar, são mandadas a calar, a se “pôr no seu lugar”.
E a pergunta que não quer calar é: qual lugar?
O lugar que nos querem impor? O da submissão, do silêncio, da invisibilidade? Ou o lugar que escolhemos ocupar, com coragem e competência, abrindo caminhos, mesmo quando eles são áridos?
Marina respondeu com a força de quem sabe o que quer: não, ela não será submissa. Não, ela não se intimidará.
E nós também não.
Este não é apenas um episódio isolado, mas um lembrete: a misoginia e o racismo seguem tentando nos empurrar para fora dos lugares que escolhemos ocupar com tanto esforço. Mas também é uma prova de que, cada vez mais, estamos prontas para resistir, para falar, para desobedecer.
E, sobretudo, para afirmar:
“Não vou me intimidar, não.”
Como escreveu bell hooks:
“Mulheres negras têm resistido, amado e se mantido inteiras apesar de todas as tentativas de quebrar seus corpos e silenciar suas vozes.”
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Por Raka Costa